A juíza fez, nessa parte da sentença, uma dupla interpretação. Ela tomou como válida e satisfatória a “oferta” da “Lei Morando” que propunha que a Mercoteles empregasse os trabalhadores da cooperativa, entre outras concessões teóricas (como o reconhecimento dos custos de reforma do edifício feita pela cooperativa, até uma soma evidentemente insuficiente de US$ 150.000). A esse respeito, ele afirmou que: A Mercoteles S.A. fez uma oferta formal “…com o objetivo de contribuir para a solução do conflito gerado como resultado da falência da empresa Solari S.A. com os ex-trabalhadores da mesma e de outro pessoal atualmente incorporado e agrupado sob as ordens da Cooperativa Buenos Aires Una Empresa Nacional Limitada…” destacando sua “…vontade corporativa de estruturar uma solução positiva para o mesmo com base nas propostas que são assumidas como obrigações…”.
Em outras palavras, a Mercoteles reafirmou que estava disposta a renovar a proposta já feita na “Lei Morando” (reconhecendo indiretamente, a propósito, sua autoria ou, pelo menos, a participação na formulação da própria lei). Mas a juíza acrescentou que aceitar e realizar esse tipo de negociação é um dos objetivos das empresas recuperadas, de acordo com a concepção particular que ela tomou para definir este complexo processo social e econômico.
Para resumir e simplificar: os patrões oferecem uma negociação e as empresas recuperadas são obrigadas a negociar com os patrões. Tudo o que lhes restava era desocupar o hotel. Esta é, logicamente, a seguinte conclusão da decisão: “É, portanto, apropriado, à luz do acima exposto e com o alcance que surge do presente, ordenar a restituição do imóvel localizado na Avenida Callao 346/60, onde está localizado o Hotel Bauen, a seu proprietário”. É claro que, nesse ponto, há um problema: o hotel está totalmente operacional sob a administração da cooperativa BAUEN. Se eles não aceitassem a oferta, a juíza teria que ordenar o despejo, e como ficou claro em toda a argumentação pela qual passamos até agora, em seus olhos azuis claros a culpa pelo despejo recai, sem mais delongas, sobre os próprios trabalhadores, inflexíveis em aceitar uma oferta que eles não deveriam ter recusado.
Para não abusar, e devido aos inconvenientes que poderia causar aos hóspedes do hotel, a resolução fixou um prazo de 30 dias para “poder realizar a restituição da propriedade da forma mais limpa e calma possível”, que seria divulgada por editais que, naturalmente, a Mercoteles SA teria que pagar.
Esse prazo foi cumprido em 20 de agosto de 2007. Como sabemos quase dez anos depois, as coisas não saíram como a juíza Paula Hualde e a Mercoteles SA queriam, e a Mercoteles SA perdeu o dinheiro dos anúncios nos jornais La Nación e Clarín. Entre outras coisas, toda a decisão foi baseada em uma falsa suposição: os trabalhadores da BAUEN não formaram uma cooperativa ou ocuparam o hotel para negociar com o Iurcovich. Como em todas as empresas recuperadas no país, eles o fizeram para poder trabalhar com dignidade.